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Relação entre empregadores e trabalhadores: Mudanças à vista

Por Percival Maricato*

O País se movimenta. Valorização da liberdade deve ser a tônica neste futuro próximo, especialmente na Secretaria comandada por Rogério Marinho, que irá extinguir excesso de regulamentações que privilegiam burocracia. Haverá cada vez mais liberdade para o mercado e menos corporativismo, regulamentações e burocracia. Haverá mais manifestações livres de vontade, facilidades de crescimento econômico, pessoal, profissional, avanço que se dará especialmente em atividades onde o atraso regulamentador é mais sentido. A liberdade de atuar no mercado estará à frente das mudanças e, entre os mais atingidos, estará o sistema sindical que, se não mudar radicalmente, ficará cada vez mais dispensável, em que pese a existência de lideranças competentes, combativas e democráticas. Mas isso não é suficiente para anular tendências históricas.

As entidades civis poderão sobreviver e se fortificar nessa nova conjuntura, graças a experiência e a cultura de viver sem contribuições obrigatórias. Deverão, no entanto, reforçar qualidades pelas quais atraem associados: trabalho a nível institucional, a prestação de serviços, a participação dos associados nos destinos da entidade, a transparência, que gera confiabilidade, a combatividade, entre outras.

A liberdade sindical já era pleito forte e inserido na Constituição de 1988, apoiada inclusive em resoluções da Organização Internacional do Trabalho (OIT). Logo depois, a pressão foi dos sindicatos pela manutenção da exclusividade no controle e regulação da relação entre trabalhadores e empresários nas diversas atividades econômicas ou profissionais em determinados territórios. O principal instrumento de regulação seria a convenção coletiva. O argumento era a confusão que poderia ocorrer com multiplicação infindável de sindicatos e de muitas convenções coletivas, muitos pisos, etc.

Atendendo essa argumentação, o Supremo Tribunal Federal acabou decidindo que a liberdade continuava, mas os sindicatos deveriam ser registrados no Ministério do Trabalho e seria possível um único sindicato de determinada atividade e localização geográfica. Foi o jeitinho brasileiro para resolver a contradição. Bem examinada a decisão, o STF contraria até a Constituição. Para compensar, consolidou jurisprudência favorável ao direito de atividades econômicas e categorias específicas terem seus próprios sindicatos, se mostrassem um mínimo de diferenciação. Desde então, bom tempo se passou, os sindicatos se multiplicaram; há mais de 17 mil no país. Muitos queriam apenas receber contribuições obrigatórias e outras verbas, participar de alguma forma das benesses do poder político e especialmente o cartorial.

Como o convencionado sobre o legislado e as contribuições obrigatórias com outros nomes irão sobreviver?

A grande questão que será resolvida nos próximos anos, talvez meses será até onde o convencionado entre empresários e trabalhadores poderá ter validade. Evidente que apesar da letra da lei, o convencionado deverá atender a limites, inclusive de princípios constitucionais (finalidade, adequação, legalidade, proporcionalidade, moralidade, razoabilidade). E nesse contexto, o mais importante para os sindicatos será a sobrevivência das contribuições obrigatórias, agora com outros nomes.

A reforma trabalhista ocupou-se em seis artigos de declarar extinta a contribuição obrigatória. Antes os tribunais já tinham liquidado as tentativas de cobrar contribuições assistenciais e confederativas. Mais recentemente a Medida Provisória 873 reforçou o entendimento. Ainda que faça referencia apenas a trabalhadores evidente que por extensão interpretativa pode acabar atingindo sindicatos patronais. Pode ser repelida pelo Congresso, mas a lei da reforma trabalhista persistirá.

No momento, muitos sindicatos tentam contornar o problema de esvaziamento do caixa, convenções ou acordos coletivos, mas com duvidosa sustentação jurídica, pois em aparente confrontação com a lei. cobrando essas contribuições com outras denominações, por outros meios, usando

O combate continuará na Justiça do Trabalho, onde muitos juízes continuam a defender o direito dos sindicatos cobrarem contribuições obrigatórias, se aprovadas por assembleias e inseridas em convenções. No entanto, esse debate chegará ao TST, que está mudando rapidamente, com a nomeação de ministros mais afinados com a antiregulação, pautas mais liberais e menos corporativa. Por sua vez, se chegar ao STF, a probabilidade de extinção de contribuições obrigatórias, quaisquer que sejam seus nomes, terá pouca chance de sobreviver. A sobrevivência da contribuição ainda pode ocorrer por mudanças legislativas, talvez em alguma negociação onde o governo precise dos votos afinados com o sindicalismo. Até o fim de 2020 certamente tudo ficará mais claro.

O que devem fazer os líderes?

Muitos sindicatos já se adequaram e têm na prestação de serviços e na confiabilidade de grandes empresas do setor, o suficiente para fortalecer-se e sobreviverem. Alguns vem “fazendo do limão uma limonada”, a “lição de casa” ou seja, estão mudando para melhor, fortalecendo a imagem, sendo mais propositivos, eficientes, crescendo, absorvendo concorrentes.

Tem muito a ver com os rumos que essa situação poderá evoluir a aprovação da terceirização e as tendências no governo federal e dos principais estados. O que se impõe na nova ordem são os rumos acima referidos, de maior liberdade de ação de agentes econômicos e sociais, menos restrições, corporativismo e regulações em atividades relacionadas à produção econômica.

Aplicada na área sindical, isso significa, mais tarde ou mais cedo, no fim da obrigatoriedade de contribuições, e em liberdade sindical. Afinal, o sindicalismo não está fora do mundo. Voltando a reforma trabalhista, ali consta a possibilidade de se fazer contratos individuais em diversas áreas, um artigo que diz que acordo coletivo vale mais que convenção, muitos outros condenando o corporativismo. Entendemos que se funcionários de uma empresa tem uma pauta com determinados pleitos e chama seu sindicato para tentar acordo com a empresa e este não comparece, podem eles fazer uma assembleia e fazer acordo com a mesma, ainda que sem a presença do sindicato. Isto certamente valerá muito mais ainda até 2020. Como tem sido reconhecido cada vez mais, mesmo na Justiça do Trabalho, acordos individuais e setoriais.

Com as grandes federações. confederações e centrais sindicais enfraquecidas (sindicatos que recebem contribuições com outros nomes não se sentem obrigados a repassar partes do arrecadado, pois a lei fala apenas em repasse de contribuições obrigatórias), por esse ar de novidade e liberdade, não se descarte novas desregulamentações vindas do novo governo, do novo Congresso, por decisões do Judiciário. Exceto na área trabalhista, as demais sempre foram sensíveis a alterações na vida social. A Justiça do Trabalho também mudará, ainda que em prazo mais longo.

Na mudança para maior liberdade sindical, entidades sindicais e líderes competentes, transparentes, combativas, não têm o que perder. Muito ao contrário, poderão atrair mais filiados espontâneos, ter mais força para negociar, irão absorver entidades mais frágeis. Não chegaremos a situação de muitos países que tem algumas poucas entidades sindicais, mas certamente mais da metade dos que existem fecharão as portas. O mercado se encarregará de equacionar a multiplicação de acordos e convenções. Os trabalhadores poderão escolher que sindicato deve representa-los em determinada negociação e por sua vez, têm eles garantido o essencial: quase duas dezenas de conquistas prescritas na Constituição de 1988; negociarão a partir desse patamar e a torcida é que melhorem as condições de vida. Melhores remunerações são maiores recolhimentos previdenciários, famílias com saúde e em condição de educar seus filhos, formação de mercado de consumo respeitável e paz social. É o caminho para se ter uma grande nação economicamente forte, socialmente justa, politicamente democrática, soberana, respeitada e independente junto as demais do planeta.

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