Apesar da expectativa das empresas de mais segurança nas relações do trabalho a partir da reforma trabalhista, a Justiça tem concedido decisões contraditórias desde a entrada em vigor da Lei nº 13467, em 11 de novembro. Advogados aguardam uma orientação maior do Tribunal Superior do Trabalho (TST) sobre a aplicação da norma, mas isso ainda não ocorreu.
Há magistrados, por exemplo, que já condenaram trabalhadores a pagar honorários de sucumbência (devidos ao advogado da parte vencedora) em processos antigos e outros que dispensam o pagamento por entenderem que no momento de propor a ação trabalhista a norma ainda não existia e, portanto, não seria possível ter ciência da possível condenação.
Advogados apostam que a tendência é que os temas de direito material (que tratam dos pedidos e, si como terceirização, horas extras, horas intinere etc.) só poderão ser aplicados aos processos ajuizados após 11 de novembro. Já as questões processuais, como prazos e custas teriam aplicação imediata a todos os processos pendentes de decisão.
Existe a expectativa de que o TST limite a aplicação da lei quando revisar as súmulas e jurisprudência da Corte em razão das alterações da reforma trabalhista. A Corte discutirá as questões em sessão do Pleno em 6 de fevereiro. Deve analisar 35 propostas de alteração de súmulas e orientações jurisprudenciais, que abrangem tópicos como custas processuais, seguro-desemprego, horas intineres, férias, diárias intrajornada.
A Corte já revisou o regulamento interno sobre temas processuais, mas questões de direito material não foram discutidas. A tendência para o ministro do TST Aloysio Corrêa da Veiga, presidente da Comissão Permanente de Regimento Interno do TST, é analisar a cada caso se a legislação nova será aplicada. “Nós vamos conviver com duas legislações durante um tempo. As matérias novas ainda não chegaram ao tribunal, sobretudo com relação ao direito material. Nos casos antigos não há que se falar das novas regras”.
Para o ministro, “algumas regras da reforma se aplicam e outras não. É preciso que se consagre um respeito àquilo que foi adquirido. Regras de interpretação intertemporal não podem retroagir para prejudicar. Ao que vier daqui para frente se aplica regra nova”, afirma.
Na tentativa de diminuir as incertezas, alguns Tribunais Regionais do Trabalho (TRTs), como o TRT do Rio Grande do Sul e de Campinas editaram resoluções para orientar os juízes quanto à aplicação da norma. No caso do TRT do Sul, a interpretação está de acordo com a tendência de no direito material aplicar a reforma somente aos processos posteriores a 11 de novembro. No TRT de Campinas, as orientações já foram votadas, mas o conteúdo ainda não foi divulgado.
Com base na hipótese de que os trabalhadores só sofreriam as alterações da reforma nas demandas posteriores a 11 de novembro, o TRT de São Paulo registrou um número recorde de novas ações na véspera da entrada em vigor da lei. Foram 12.626 novos processos no tribunal. Praticamente sete vezes mais que a média diária de ações do mês de novembro, de 1.879 casos novos.
Segundo o professor de Direito do Trabalho da FGV, Sólon Cunha, diante da polêmica causada, o presidente do TST, ministro Ives Gandra Martins Filho, afirmou em outubro, durante evento em São Paulo da Federação do Comércio de Bens, Serviços e Turismo do Estado de São Paulo (FecomercioSP), em parceria com a Federação Nacional dos Bancos (Fenaban), que como não há unanimidade sobre o tema, não haveria uma regulamentação detalhada por ora. Ao contrário do que ocorreu quando entrou em vigor a Emenda Constitucional nº 45 de 2004, quando o TST baixou resolução que serviu de base para os juízes. “Isso gerou certa paz no ambiente na época”, diz.
Segundo o advogado Flavio Pires, sócio da área trabalhista do Siqueira Castro, o mais razoável é que apenas os processos que entraram na Justiça após 11 de novembro sejam atingidos pela reforma com relação ao direito material. Ele se baseia em princípios constitucionais como o direito adquirido, o ato jurídico perfeito e a coisa julgada, além das previsões da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) de que uma lei só pode retroagir para beneficiar o empregado. “Nesses casos, vale o momento de interposição da ação. Senão seria muito injusto que um empregado que tinha direito a um benefício pecuniário, quando entrou com a ação, que a lei alterasse seu direito”, diz.
Com relação às discussões processuais, o artigo 14 do Código de Processo Civil (CPC) é claro ao prever que a norma processual não retroagirá e será aplicável imediatamente aos processos em curso, respeitados os atos processuais praticados. Nesse caso, se houver sentença, ela poderia ser reformada em segunda instância com base na reforma, por exemplo, segundo os advogados trabalhistas. Nesse sentido, já valeria para todos os processos que tramitam a contagem de prazo em dias úteis e não mais corridos, as alterações com relação a custas processuais, ao uso de seguro garantia recursal, entre outras mudanças. A dúvida maior fica com relação aos honorários sucumbenciais e pagamento de perícia.
De acordo com a advogada Mayra Palópoli, sócia do escritório do Palópoli & Albrecht Advogados, mesmo que os pedidos não tenham sido feitos com base na lei nova, quando se trata da aplicação da parte processual, os magistrados têm solicitado que os pedidos sejam adequados ao que diz o texto da reforma.
Fonte: Valor Econômico