Em meio à discussão da reforma tributária na Câmara dos Deputados, começa a ganhar corpo a ideia de ressuscitar a velha CPMF, o imposto sobre movimentações financeiras defenestrado em 2007. Só que, em vez de propor diretamente a recriação do tributo, a ideia do deputado Luiz Carlos Hauly (PSDB-PR), relator da Comissão Especial de Reforma Tributária na Câmara, é turbinar o Imposto sobre Operações Financeiras (IOF), incidente sobre gastos no exterior e operações de crédito, para que ele cumpra, na prática, o mesmo objetivo. “A CPMF é o IOF”, disse Hauly ao Estado, na semana passada. O objetivo é que o IOF seja usado para reduzir o rombo na Previdência Social, em vez de financiar a saúde, como a CPMF. “Seria um imposto de operações e movimentações financeiras, mas para fins previdenciários, pela necessidade de arrecadação deles.”
Hauly afirma que o IOF turbinado deverá ser compensado pela diminuição pela metade das alíquotas do INSS pagas pelos empregadores (22%) e pelos empregados (11%), a ser incluída no projeto de reforma tributária que ele deverá apresentar até o final do ano na Comissão Especial. Ao mesmo tempo, porém, Hauly diz que a intenção com o novo IOF é “ajudar na arrecadação nacional”. “Nossa proposta é levar o IOF para o INSS e resolver o problema de financiamento da Previdência”, afirma. “Tem trabalhador rural sem contribuição definida, seis milhões de trabalhadores do MEI (microempreendedores individuais) que contribuem com R$ 40 por mês, que não cobrem a necessidade da Previdência, milhões de domésticas que começaram a pagar (as contribuições) há dois anos e vão entrar na Previdência e três milhões idosos e deficientes físicos que estão recebendo benefícios de prestação continuada.”
Diante do fracasso das tentativas de ressuscitar a CPMF nos últimos anos, a iniciativa de Hauly parece ser de altíssimo risco. Ao tentar evitar a sua extinção, há nove anos, o ex-presidente Lula sofreu sua maior derrota no Legislativo em seus dois mandatos. Mais recentemente, já no segundo mandato, a ex-presidente Dilma Rousseff chegou a defender a volta do tributo para reforçar o caixa do governo e aliviar a crise fiscal, mas teve de abandonar a proposta antes mesmo de enviá-la ao Congresso Nacional, em razão da rejeição que sofreu por parte dos empresários e de amplos segmentos da sociedade. Na época, a Fiesp, a entidade que reúne os industriais paulistas, lançou a campanha “Não vou pagar o pato” e instalou um pato inflável amarelo no canteiro central da Esplanada dos Ministérios, em Brasília, contra o aumento de impostos e a volta da CPMF. O pato também foi instalado na sede da Fiesp, na avenida Paulista, em São Paulo, e tornou-se personagem de destaque na campanha pelo impeachment de Dilma.
Ao ser questionado se faz sentido repassar para a sociedade a fatura previdenciária, Hauly afirmou que “esse conjunto de pessoas é problema nacional e não só da Previdência”. “Acho que tem um pouco de prevenção (contra a CPMF). Mas não tem outra solução a não ser que o governo pretenda continuar transferindo dinheiro da receita dele para a Previdência”, diz. “Tem que sustentar hoje um contingente de milhões de pessoas que são assistência social e que não são. O trabalhador rural é (assistência) social ou previdenciária, se ele sustenta a economia brasileira com a produção rural? E o autônomo que está na sua casa e na de milhões de brasileiros consertando chuveiro, fogão, geladeira, porta? Tem que fazer o sistema funcionar, ser exequível e o mais justo possível.”
Em meados de outubro, ao assumir o posto de relator da Comissão Especial, em substituição ao deputado André Moura (PSC-SE), líder do governo na Câmara, Hauly defendeu abertamente a volta da CPMF. Depois, talvez para evitar o desgaste inevitável de propor a medida, passou a apoiar a volta da CPMF travestida de IOF. Sobre as críticas de tributaristas em relação à cumulatividade da CPMF, que deverá onerar ainda mais a produção e penalizar os cidadãos, ele declarou: “Já está provado cientificamente que não é um imposto mais cumulativo que o ICMS (Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços) e o IPI (Imposto sobre Produtos Industrializados)”. Detalhe: um dos objetivos da reforma tributária de que ele é o relator é justamente eliminar a cumulatividade do IPI e do ICMS, pelos efeitos nocivos que exercem sobre os negócios e a produtividade do País.
Fonte: Estadão