Começa a valer nesta sábado (11/11) a reforma trabalhista, com mais de 100 mudanças na Consolidação das Leis do Trabalho (CLT). O texto, sancionado em julho, tem novas definições sobre férias, jornada de trabalho e a relação com sindicatos das categorias. A contribuição sindical passou a ser opcional, e foram reguladas duas modalidades de contratação: trabalho intermitente (por jornada ou hora de serviço) e teletrabalho, chamado home office.
A Lei 13.467/2017 se aplica a todas as categorias regidas pela CLT e também àquelas que dispõem de legislações específicas – como trabalhadores domésticos, atletas profissionais, aeronautas, artistas, advogados e médicos – no que for pertinente.
Uma série de regras deve mudar as ações na Justiça do Trabalho: o trabalhador que faltar à audiência inaugural será punido com a extinção do processo e obrigado a pagar as custas processuais, mesmo que beneficiário da Justiça gratuita. Caso perca a ação, também terá de arcar com as custas do processo.
Beneficiados com acesso à Justiça gratuita também podem ser obrigados a pagar honorários de perícias se tiverem créditos em outros processos suficientes para o pagamento da despesa. Caso contrário, a União arcará com os custos.
Quem perder a causa terá de pagar entre 5% e 15% do valor da sentença aos advogados da parte vencedora, como honorários de sucumbência. Até então, isso não acontecia na Justiça do Trabalho, diferentemente de outros ramos do Judiciário.
Se o juiz considerar que determinada parte agiu com má-fé, poderá fixar multa de 1% a 10%, além de indenização para a parte contrária. É considerado má-fé alterar a verdade dos fatos, usar o processo para objetivo ilegal e gerar resistência injustificada ao andamento do processo, por exemplo.
A nova lei também tenta impor limites nas decisões: a Justiça do Trabalho deve seguir regras para valores de indenizações e não poderá restringir direitos legalmente previstos nem criar obrigações que não estejam previstas em lei. A intervenção da Justiça em questões relacionadas ao exame de convenção coletiva ou acordo coletivo de trabalho deverá ser mínima.
Críticas e contra-ataque
Juízes já se articulam contra pontos da reforma. Em outubro, um encontro da Associação Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho aprovou teses que consideram autoritário e antirrepublicano pressionar que magistrados interpretem de maneira literal a nova legislação.
Para 344 juízes trabalhistas, 70 auditores fiscais do trabalho e 30 procuradores que participaram do evento, é inconstitucional vincular o cálculo da indenização por danos morais ao salário e instituir jornada de trabalho de 12 por 36 horas mediante acordo individual, por exemplo. Ministros e representantes de associações declararam que várias mudanças não se tornarão realidade, pois desrespeitam também tratados internacionais dos quais o Brasil é signatário.
Já confederações de empresas da indústria e dos transportes se preparam para reclamar ao Conselho Nacional de Justiça sempre que se depararem com a “rebeldia” da magistratura trabalhista.
A reforma trabalhista também é alvo de ações no Supremo Tribunal Federal. A Procuradoria-Geral da República entende que três dispositivos (artigos 790-B, 791-A e 844) sobre pagamento de custas judiciais e honorários de sucumbência violaram “direito fundamental dos trabalhadores pobres à gratuidade judiciária”. Confederações também querem retomar a cobrança obrigatória da contribuição sindical.
Sem ajustes
Quando a lei foi aprovada, o presidente Michel Temer (PMDB) chegou a prometer uma Medida Provisória para corrigir alguns pontos do texto. Até agora, porém, nenhuma alteração foi publicada pelo governo federal.
O ministro do Trabalho, Ronaldo Nogueira, fez declarações a favor da reforma na noite desta sexta-feira (10/11), em cadeia de rádio e TV. Ele insistiu que a lei foi idealizada para gerar mais empregos, sem retirar direitos.
“A modernização teve como base três eixos: consolidar direitos, promover a segurança jurídica e gerar empregos. Consolidar direitos, pois direito não se revoga, apenas se aprimora. Promover a segurança jurídica, pois apenas ela traz crescimento econômico duradouro. E apenas o crescimento econômico pode gerar empregos, o maior de todos os direitos do trabalhador. Assim, foram mantidos todos os direitos trabalhistas”, disse.
Horas antes do pronunciamento, centrais sindicais organizaram protestos em diversos estados pedindo a revogação de alguns pontos do texto.
O ministro Ives Gandra da Silva Martins Filho, presidente do Tribunal Superior do Trabalho, já declarou que o texto deve frear a judicialização das relações de trabalho e desafogar a Justiça, para que ela consiga julgar as questões realmente importantes. Com informações da Agência Brasil.
Mudanças na prática
O TST lançou em outubro 12 vídeos com resumo do que considera as principais alterações: banco de horas, transporte, tempo na empresa, trabalho a distância, trabalho parcial, trabalho intermitente, férias, gravidez, descanso, contribuição sindical optativa, multa e danos morais.
O escritório Demarest Advogados elaborou um resumo com as principais alterações da legislação:
Responsabilidade empresarial
– A mera identidade de sócios não caracterizará a existência de grupo econômico entre empresas, sendo necessária a demonstração de interesse integrado e atuação conjunta das empresas;
– Limitação da responsabilidade do sócio retirante pelas obrigações trabalhistas relativas ao período em que figurou como sócio, e somente em ações ajuizadas até dois anos após a averbação da alteração societária que dispõe sobre a saída do sócio;
– As obrigações trabalhistas da empresa sucedida passam a ser de responsabilidade da empresa sucessora, nas hipóteses de alteração da estrutura empresarial. Na hipótese de fraude, a empresa sucedida será responsável solidária pelas obrigações trabalhistas;
Prevalência do negociado
– Prevalência dos Acordos e Convenções Coletivas sobre as regras estabelecidas na CLT, exceto para questões envolvendo normas de identificação profissional, salário mínimo, remuneração do trabalho noturno superior ao diurno, repouso semanal remunerado, remuneração do serviço extraordinário no mínimo 50% superior ao normal, número de dias de férias, saúde, segurança e higiene do trabalho, FGTS, 13º salário, seguro-desemprego, salário-família, licença-maternidade de 120 dias, aviso prévio proporcional ao tempo de serviço, entre outros;
– Preponderância das normas estabelecidas através de Acordos Coletivos sobre aquelas previstas em Convenções Coletivas, não mais sendo aplicável a regra de que os Acordos Coletivos seriam preponderantes somente naquilo em que fossem mais favoráveis;
– Os empregados portadores de diploma de nível superior e que recebam salário igual ou superior a duas vezes o limite máximo dos benefícios do Regime Geral de Previdência Social (atualmente o limite máximo é de R$ 5.531,31) poderão estipular livremente as condições de trabalho de forma individual, sendo que tais estipulações terão eficácia legal e preponderância sobre eventuais normas coletivas, observadas certas limitações;
Férias
– Possibilidade de fracionamento das férias em até 3 períodos, sendo que um deles não poderá ser inferior a 14 dias corridos e os demais não poderão ser inferiores a 5 dias corridos, cada um. Ainda em relação às férias, os empregados sob o regime de tempo parcial passam a ter direito a férias de 30 dias após cada período de 12 meses de trabalho, não mais estando sujeitos às regras de férias proporcionais ao número de horas trabalhadas;
– Possibilidade de fracionamento de férias aos menores de 18 anos e maiores de 50 anos;
Jornada
– O sistema de compensação de jornada de trabalho conhecido como “Banco de Horas”, anteriormente autorizado somente via norma coletiva, passa a ser autorizado por acordo individual com o trabalhador, desde que a compensação ocorra no período máximo de 6 meses;
– Extinção do direito às horas “in itinere”, assim consideradas aquelas que o trabalhador incorria no percurso entre sua residência e o local de trabalho, quando o empregador fornecia transporte até local de difícil acesso ou não servido por transporte público;
– As horas extras decorrentes da ausência de concessão de intervalo intrajornada, antes consideradas como pagamentos de natureza salarial, passam a ser expressamente tratadas como verba de natureza indenizatória, não refletindo no cálculo de outros direitos trabalhistas. Paralelamente, o tempo de intervalo intrajornada poderá ser alvo de negociação coletiva desde que respeitado o período mínimo de 30 minutos;
– Os períodos em que o empregado permanecer nas dependências da empresa para realização de atividades particulares, assim como alimentação, descanso, lazer, estudo, relacionamento pessoal, troca de uniforme quando não houver a obrigatoriedade de realizar a troca dentro da empresa, entre outros, passam a ser expressamente considerados como tempo em que o empregado não está à disposição do empregador, não sendo devido o pagamento de horas extras pelo período correspondente caso ocorra fora da jornada;
– Possibilidade de se pactuar o sistema de jornada de trabalho 12×36 por acordo individual (anteriormente tal estrutura somente poderia ser implementada por norma coletiva), desde que observados ou indenizados os períodos de intervalo para repouso e alimentação;
– O trabalho em regime de tempo parcial – antes definido como aquele cuja duração não excedia a 25 horas semanais -, passa a ser considerado como aquele que não exceda a 30 horas semanais, sem a possibilidade de horas suplementares semanais, ou, ainda, aquele cuja duração não exceda a 26 horas semanais, com a possibilidade de acréscimo de até 6 horas suplementares semanais;
– Extinção do direito ao intervalo de 15 minutos antes do início da prestação de trabalho em horas extraordinárias;
Trabalho Intermitente
– Instituição do contrato de trabalho intermitente — assim considerado aquele em que a prestação de serviços, com subordinação, não é contínua, ocorrendo com alternância de períodos de prestação de serviços e inatividade determinada em horas, dias ou meses —, excetuada a aplicação aos aeronautas;
Teletrabalho (home office)
– Passa a ser regulamentado e os empregados sob tal sistema passam a ser expressamente excluídos do regime de controle de jornada, desde que tal condição esteja devidamente prevista em contrato de trabalho;
Equiparação salarial
– Possibilidade de estabelecimento de salários distintos para empregados com diferença de 04 anos ou mais de prestação de serviços para o mesmo empregador, mantido o requisito atual de 02 anos na mesma função;
– Os requisitos para equiparação salarial não serão aplicáveis quando a empresa adotar, por meio de norma interna, ou negociação coletiva, plano de cargos e salários, dispensada a homologação pelo Ministério do Trabalho;
– A equiparação salarial somente será possível entre empregados contemporâneos no cargo ou na função, ficando extinta a possibilidade de equiparação com paradigmas remotos;
Natureza indenizatória
– Deixam de ter natureza salarial os pagamentos feitos a título de diárias para viagem, abonos, auxílio-alimentação (desde que não pago em dinheiro) e prêmios (liberalidades concedidas em razão de desempenho superior ao ordinariamente esperado no desempenho das atividades), os quais deixam de incorporar o contrato de trabalho e de constituir base para incidência de encargos trabalhistas e previdenciários;
Rescisão do contrato de trabalho
– Possibilidade de rescisão contratual por mútuo acordo, prevendo o pagamento do aviso prévio e da multa do FGTS em montantes reduzidos, bem como a possibilidade de o empregado movimentar 80% dos valores depositados na conta do FGTS;
– Alteração do prazo para pagamento das verbas rescisórias em caso de aviso prévio trabalhado;
– Extinção da obrigação de homologação da rescisão dos contratos de trabalho;
– Regulamentação expressa sobre dispensas coletivas, desobrigando os empregadores de negociação prévia com os sindicatos;
– Regulamentação de Planos de Demissão Voluntária (PDV) e dos Planos de Demissão Incentivada (PDI), conferindo quitação plena e irrevogável dos direitos decorrentes da relação empregatícia quando implementados via acordo coletivo de trabalho;
Solução de conflitos
– Possibilidade de estabelecimento de cláusula compromissória de arbitragem para empregados cuja remuneração seja superior a duas vezes o limite máximo estabelecido para os benefícios do Regime Geral de Previdência Social (atualmente o limite máximo é de R$ 5.531,31);
– Regulamentação do Processo de Jurisdição Voluntária para Homologação de Acordo Extrajudicial;
Representação dos trabalhadores
– Obrigatoriedade de constituição de comissão interna de empregados para as empresas com mais de 200 empregados, com o objetivo de representar os trabalhadores perante a administração da empresa. O mandato dos membros da comissão será de 1 ano, sendo garantida estabilidade provisória de até 1 ano após o término do mandato;
– Extinção da contribuição sindical compulsória;
Dano extrapatrimonial
– O dano extrapatrimonial passa a ser regulamentado nas relações de trabalho, sendo fixados parâmetros para definição do valor da indenização;
Processo do Trabalho
– Honorários periciais passam a ser devidos pela parte sucumbente no objeto da perícia, ainda que tal parte seja beneficiária da Justiça Gratuita, com a possibilidade de tal ônus ser arcado pela União;
– Os advogados passam a ter direito aos honorários de sucumbência, variando de 5% a 15% sobre o valor da liquidação da sentença;
Terceirização
– Previsão expressa quanto à possibilidade de terceirização de quaisquer atividades, inclusive da atividade principal da empresa;
– Assegura aos empregados da empresa prestadora de serviços, quando e enquanto os serviços forem prestados no estabelecimento da tomadora, as mesmas condições oferecidas aos empregados da tomadora em relação à alimentação quando oferecida em refeitório; serviços de transporte; atendimento médico ou ambulatorial; treinamento; condições sanitárias e medidas de proteção à saúde e segurança do trabalho;
– Proíbe pessoa que tenha sido empregado da tomadora ou que lhe tenha prestado serviços sem vínculo nos últimos 18 meses, de figurar como sócio de empresa contratada, exceto se referido sócio for aposentado;
– Proíbe que ex-empregados da tomadora demitidos há menos de 18 meses voltem a lhe prestar serviços na capacidade de empregados de empresa prestadora de serviços antes do decurso do referido prazo.
Fonte: Revista Consultor Jurídico