O Tribunal Superior do Trabalho (TST) foi na direção contrária da própria jurisprudência e aceitou a validade de uma negociação coletiva que flexibilizava a Lei de Cotas para vagas de trabalho de pessoas com deficiência (PcD).
“Não é uma decisão recorrente no tribunal, que prefere adotar uma interpretação mais literal da lei”, observa o advogado especialista em Relações do Trabalho do Rocha, Calderon e Advogados Associados, Fabiano Zavanella.
No caso, o Ministério Público do Trabalho (MPT) entrou com ação no Judiciário para anular a cláusula de um acordo coletivo firmado entre um sindicato de trabalhadores e um sindicato do segmento de Segurança Privada, de Transporte de Valores, de Cursos de Formação e de Segurança Eletrônica do Tocantins. A negociação coletiva restringiu, por meio desse contrato, a base de cálculo da reserva legal de vagas para PcD às vagas de emprego de natureza administrativa.
Na primeira instância, o processo foi considerado improcedente, de modo que o MPT entrou com recurso na Oitava Turma do Tribunal Superior do Trabalho. Lá, a relatora, ministra Maria Cristina Irigoyen Peduzzi, acolheu a linha de argumentação da empresa e manteve a decisão anterior, reafirmando a legalidade da cláusula.
Na opinião de Zavanella, o juízo abre um precedente importante no aumento da importância da convenção coletiva, uma das bandeiras levantadas pela Reforma Trabalhista. “O TST colocou a legislação trabalhista à luz da especificidade do caso e entendeu que não era possível manter a multa do MPT”, afirma o especialista.
Para Zavanella, apesar de aparentemente ser um juízo mais favorável às empresas, o próprio bem-estar do trabalhador foi levado em consideração nesse caso, o que foi essencial para o convencimento dos ministros. “A criação de vagas é menor pela cláusula do acordo, mas também tem uma preocupação razoável com a segurança do PcD. Em uma atividade de risco como segurança, que para quem não tem limitação já é perigoso, colocar uma pessoa que possui deficiência é, no mínimo, temerário”, defende o especialista.
Já o sócio do Capano, Passafaro Advogados Associados, Leonardo Passafaro, acredita que foi importante o reconhecimento da dificuldade que as empresas de alguns setores possuem em preencher suas vagas para pessoas com deficiência. “Acho que o TST corrigiu uma situação criada pelo MPT, que não soube ter o bom senso de perceber que a companhia tentou encontrar PcDs para cumprir a cota, mas que isso foi impossível em virtude da própria área de atuação da empresa”, avalia. “A companhia chegou disponibilizar vaga, mas o ramo dela é muito complicado. São milhares de seguranças armados que atuam sob ameaça constante.”
Condições especiais
O especialista acredita que foi essencial para a consolidação do entendimento do tribunal a comprovação de boa-fé apresentada pela negociação feita com um sindicato representativo dos funcionários.
O sócio do Rocha, Calderon, Fabiano Zavanella, conta que outras atividades, como a de manutenção de linhas de alta tensão são casos que mostram como não pode ser aplicada a letra da lei sem se levar em consideração a natureza do trabalho. “O cálculo não pode ser frio. Quando o sindicato que defende o direito dos trabalhadores deixa a atividade fora desse cômputo, isso deve ser respeitado”, acrescenta.
Passafaro ressalta que não é o bastante apenas contratar uma pessoa com deficiência, é preciso colocá-la em um trabalho adequado, com boas condições de acessibilidade e adaptação para a melhor integrá-lo às atividades.
Nesse quesito, Zavanella entende que o Estado deveria dar o exemplo. “O PcD merece um tratamento isonômico, mas é uma responsabilidade do Estado também oferecer condições como transporte, acessibilidade das ruas, qualidade das escolas especiais etc”.
Passafaro reforça que a lei que estabelece cotas para PcD é boa, o problema é a falta de bom senso no caso a caso.
Fonte: DCI